Embora publicado em 1885, o conto machadiano A causa secreta, por meio do personagem Fortunato, aborda um tema universal e atemporal: a falta de empatia, o comportamento sádico. A racionalidade que rege essa conduta pode ser enquadrada na atualidade, visto que é extremamente entristecedor e preocupante o quadro atual de menos valia que a humanidade está atribuindo ao sofrimento do outro no ato, apático e cético, de publicação e compartilhamento de imagens trágicas.
Com a consolidação da internet, não só como fonte de informação, mas também como ferramenta para a produção e a disseminação de conteúdo, mudou-se o modo de fazer jornalismo, o que provocou um questionamento sobre o comportamento da mídia. A prática sensacionalista desses meios transforma as notícias em objetos de espetacularização, supervalorizando aspectos emocionais em detrimento de uma informação e, consequentemente, comove a opinião pública principalmente quando imagens de pessoas mortas são veiculadas. Como exemplo de situação trágica exposta, tem-se a foto que registrou um grupo de banhistas se divertindo, na praia, ao lado dos corpos de duas vítimas do desabamento de parte da ciclovia Tim Maia.
Em contraposição a esse tipo de atitude, o site Vox Media, por exemplo, acredita que a publicação de uma imagem violenta contém aspecto viral e acarreta uma superexposição desnecessária em vez de promover compaixão e empatia. Nesse sentido, na busca por audiência fácil, o sensacionalismo atiça a curiosidade das pessoas, que, por sua vez, buscam mais informações. A relação entre o público e o grotesco deixa evidente a perda de sensibilização diante dessas imagens, o que configura a banalização da dor, do horror e da angústia, garantindo a indiferença das massas frente a esses aspectos e até mesmo o conformismo da sociedade brasileira diante das tragédias.
Fica claro, portanto, que, em uma sociedade em que os meios de comunicação possuem grande representatividade, o resguardo privado e a imagem são mais facilmente agredidos. A fim de alterar esse quadro, o governo brasileiro deve regular e adequar as normas de direito à imagem, assegurado pela Constituição Federal do Brasil, e não construir novos mecanismos de proteção jurídica. Por meio da Lei Marco Civil da Internet, garante-se a inviolabilidade da intimidade, o direito a sua proteção e a indenização por dano decorrente de violação, defendendo a proteção integral da imagem de qualquer indivíduo caso não haja consentimento específico para qualquer fim. Dessa maneira, contribui-se na constante formação da humanidade para se afastar de condutas sociais e éticas como a de Fortunato.